Falar da eleição dos imperadores do Primeiro Reich por príncipes eleitores dá um tilt em qualquer um. Primeiro, onde é que imperadores são escolhidos? Votar, em si, nos soa como algo tão ligado à democracia que pouco nos faz imaginar que um imperador só era coroado depois de vencer uma eleição… Segundo, tínhamos ouvido muito falar do Terceiro Reich, que era a Alemanha nazista. Porém, de onde vem essa história de Primeiro Reich?
Primeiro Reich: o mais longevo dos três impérios
Talvez seja mais fácil esclarecer a segunda contestação acima. Ora, se existiu um Terceiro Reich na Alemanha, isso significa, necessariamente que existiram, também, um Segundo e, anterior a esse, um Primeiro Reich. E como Reich significa império, nada mais evidente do que pensar que, com exceção de Adolf Hitler, que se intitulou o Führer do Terceiro Reich, os dois primeiros impérios tiveram… imperadores… Para completar, situemos na História esses três impérios:
- Primeiro Reich: é o outro nome que podemos dar ao Sacro Império Romando-Germânico. Durou dos anos 971 a 1806.
- Segundo Reich: é o equivalente aos territórios que se unificaram para formar a Alemanha “moderna”. Durou dos anos de 1871 a 1914, ano da derrota alemã na Primeira Guerra Mundial.
- Terceiro Reich: são os anos em que Adolf Hitler esteve no poder, mais precisamente entre 1933 e 1945.
Já para falarmos de príncipes votando em candidatos a imperador, precisamos voltar um pouco no tempo, mais precisamente ao início do século 13. Nesse momento, o Sacro Império é uma gigante estrutura feudal na qual predominam relações de suserania e vassalagem. O tecido social se constitui de relações de fidelidade entre nobres e imperador, cavaleiros e poderosos locais, servos e senhores feudais.
Nobres trocavam seus votos por regalias
Com o fim da dinastia dos Staufer, donos do trono do Império até 1250, muitos nobres da mais alta hierarquia aspiram pela coroa do Sacro Império. Essa aspiração só era legítima por um pequeno detalhe: se na mesma época o princípio de sucessão do soberano na França era o da hereditariedade, na Alemanha era o da eleição. Ou seja, os imperadores do Primeiro Reich não subiam ao trono por pertencerem a uma família escolhida, abençoada e legitimada pelo poder de Deus.
Na verdade, qualquer nobre de grande envergadura política podia se candidatar a esse tão importante posto. Bastava o candidato ter dinheiro o bastante para pagar seus votos (isso hoje é considerado corrupção…) ou oferecer regalias aos eleitores: direitos nobiliários como, por exemplo, a cunhagem de moedas ou a extração de prata. E quando falamos dos eleitores em questão, são homens investidos de poder espiritual (o clero) ou temporal de diversas camadas do estrato social, tais como príncipes, condes, duques ou reis de mais de 200 estruturas políticas (podemos chamar de Estados) pertencentes ao Sacro Império.
Carlos IV e a Bula Dourada
O problema é que entre 1250 e 1356, nobres sem talento para governarem o gigante Império Alemão acabaram gerando instabilidades político-econômicas que só foram resolvidas com a chegada de um dos maiores imperadores que a Alemanha já teve, Carlos IV, da casa dos Luxemburgo, rei da Boêmia (atual Tchéquia). Ele institui como Ordem de Coroação a Bula Dourada, a qual determinava que não mais todos os nobres votavam na eleição para imperador, mas apenas sete.
Esses nobres passam a ser chamados de Príncipes Eleitores (Kurfürsten). Em seus territórios, sim, deverá prevalecer o princípio de hereditariedade, já que serão sempre as mesmas sete famílias que decidirão o futuro político do Sacro Império Romano-Germânico. Os príncipes herdeiros do trono deverão, segundo a Bula Dourada, aprender o latim, o alemão, o italiano e o eslavo. Afinal, esse grande império era, também, multiétnico e demandava representatividade.
Paramos aqui para contar, num próximo post, de onde vinham os tais dos sete Príncipes Eleitores.